Estava com preguiça até de conversar. Quando o sol chegou a pino e a paisagem caiu numa modorra só, abriu a boca pra um longo bocejo. Tão grande, que engoliu a tarde. A noite chegou de estalo com sua brisa, véu escuro, cheia de sombras.
Zamonik gostou da idéia de dormir novamente, mas os sapos tinham outros planos. Prepararam um rede fina e forte e jogaram sobre o guerreiro.
Ele nem percebeu.
Quando acordou, custou a entender. Estava dentro de um a espécie de aquário. Do lado de fora, seres imensos de cabeças verdes, afunilada, espiavam seu despertar.
Zamonik achou que tinham cara de lombriga. Sorriu quando percebeu que lhe pediam para que dançar. Ele fez uma pirueta, um salto para frente e uma cambalhota para trás...e aquela gente piscava, uma luz verde tremelicava em seus olhinhos nojentos...
Que vida boa aquela, vida em eterna festa. Pareciam baianos. Nem precisava caçar... Bom não precisar mais olhar a cara daquele povo da aldeia. Sorria, ao lembrar que estava livre dos salamaleques de gente doida para usar seus préstimos de homem habilidoso, culto e inteligente.
Preferia aqueles lumbrecóides às pessoas com quem tinha convivido até pouco tempo. Gente muito chata, sempre com medo de alguma coisa. Gente sem imaginação, sempre maledicente, reclamando da vida, com mania de doença e de olho na vida dos outros.
Um dia trouxeram uma mulher pra Zamonik. Era uma moça bem bonitinha, com longos cabelos negros e olhos amendoados. Ele se encantou, até esqueceu do público em volta, e tratou de conquistar o seu coração.
Parou de contar os dias, mandou a melancolia embora e ensaiou algumas canções.
Cantarolou, assoviou, imitou lobos e onças. Fez tudo que lembrou dos costumes tradicionais pra impressionar Ralik. Nem a dança do acasalamento funcionou.
Ralik era muito menina e ignorava seu comportamento. Na verdade, Ralik só tinha um interesse. Queria fugir e passava o tempo medindo as distâncias e fazendo cálculos.
Começou a juntar folhas de bananeiras e colocá-las para secar. Depois, fez tiras e começou à trançá-las. As mãozinhas não sossegavam e só depois de preparar uma espécie de tapete ela parou. Dormiu muito tempo. Acordou com fome e comeu muitas jabuticabas. Ninguém mais soube dela.
Os lombricóides ficaram com os olhos vermelhos ao perceberem a fuga. Zamonik quase teve um colapso, não entendia porque Ralik não contou seu plano, nem quis fugir com ele.
Moral da história: em terra estranha, mais estranho é quem dança e mais esperto é quem não cai nas armadilhas do coração...
novembro/2004