Evento abre o calendário audiovisual no país com a exibição de “Serras da Desordem”, que comemora 10 anos da sua primeira exibição, em 2006, na Mostra Tiradentes e tornou-se um marco na história do cinema brasileiro.
A Mostra de Cinema de Tiradentes chega a sua 19ª edição, de 22 a 30 de janeiro de 2016 e presta homenagens ao cineasta ítalo-brasileiro Andrea Tonacci, um dos nomes de destaque na história do cinema brasileiro.
Abre o evento, no dia 22 de janeiro, às 21h, no Cine-Tenda, com a exibição do seu filme “Serras da Desordem”, comemorando 10 anos da sua primeira exibição, em 2006, na Mostra Tiradentes.
As duas celebrações – a Tonacci e ao seu filme “Serras da Desordem” – dialogam com a temática central desta edição: “Espaços em Conflito”.
Sempre atenta ao momento atual da produção audiovisual, a Mostra Tiradentes apresenta o que vai ser o cinema de 2016.
Representa o espaço das lentes originais e independentes, estimula novos olhares, provoca descobertas, estimula o debate e, nesta edição, vai enfocar os conflitos em torno dos espaços no cinema brasileiro, afirma a coordenadora do evento, Raquel Hallak.
Em uma década, Serras da Desordem se revelou a maior referência de uma mudança de paradigmas no olhar estético e na maneira de se fazer cinema brasileiro independente e de autor.
Questões relativas aos limites tênues entre documentário e ficção se somaram, no filme, as discussões sobre o genocídio histórico contra indígenas em território nacional, ambos os assuntos constantemente na pauta cotidiana.
“Serras da Desordem” foi apresentado pela primeira vez ao público em Tiradentes e, desde então, além de ter recebido amplo reconhecimento da crítica, recolocou Tonacci na linha de frente contemporânea, tanto do pensamento cinematográfico quanto do protagonismo estético”, afirma Cléber Eduardo, curador da Mostra.
A homenagem a Andrea Tonacci é, então, um tributo a este grande inventor do cinema brasileiro, dono de uma obra até hoje menos vista do que deveria e uma das figuras de maior influência para várias gerações.
“Antes de Serras da Desordem, Tonacci já era cineasta com lugar especial na história do cinema brasileiro por conta, se não de toda a sua filmografia, certamente de ao menos outros dois filmes: o longa Bang Bang e o curta Bla Bla Bla, provocações típicas do fim dos anos 1960, com uma subversão estética e política absolutamente em sintonia com a reatividade debochada e descrente do cinema brasileiro autoral daquele momento”, completa o curador. Os três principais filmes de Tonacci serão exibidos na programação do evento.
Andrea Tonacci nasceu em Roma (Itália) em 1944 e mudou-se para o Brasil aos 11 anos de idade. Figura importante da geração chamada de Cinema Marginal, participou como ator do primeiro curta-metragem de Rogério Sganzerla, Documentário (1966), e estreou como diretor em outro curta do mesmo ano, Olho por Olho. Em 1968, exibiu Bla Bla Bla no Festival de Brasília. Seu primeiro longa-metragem, Bang Bang, de produção paulista, foi filmado na cidade de Belo Horizonte em 1970.
Entre 1975 e 2006, Tonacci produziu diversos trabalhos em vídeo, com maior destaque para Jouez encore, payez encore (1975), Conversas no Maranhão (1977) e Os Araras (1980). Só voltou ao cinema com Serras da Desordem. Após a exibição na Mostra de Tiradentes, o filme ganhou o Kikito de melhor longa no Festival de Gramado, em agosto de 2006, e teve estreia no circuito comercial em 2008.
A temática “Espaços em Conflito” tem relação direta com o cinema de Tonacci e também com toda uma produção histórica e contemporânea do cinema brasileiro. A ênfase na dramatização dos ambientes teve destaque a partir dos anos 1950, com O Canto o Mar (Alberto Cavalcanti, 1953) e Rio 40º Graus (Nelson Pereira dos Santos, 1955).
Era época em que a produção dos filmes passou a sair dos estúdios para ocupar as ruas da cidade, abrindo suas lentes ao que era captado da realidade urbana, com maior autenticidade nas locações e a imbricação desses universos à própria narrativa.
Nos anos 1960, com o Cinema Novo, filmes como Barravento (1961) e Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963), de Glauber Rocha, e outros como o coletivo Cinco Vezes Favela (Miguel Borges, Marcos Farias Cacá Diegues, Leon Hirszman, Joaquim Pedro de Andrade, 1962) e Os Fuzis (Ruy Guerra, 1964), reforçaram a tendência.
“Nos anos 70 e 80, alguns mantiveram-se na questão, procurando sua dramaturgia nos próprios ambientes. Nos últimos 25 anos, apesar das mudanças de tom e de enfoque, os espaços continuaram conflitantes, às vezes com violência, às vezes sob sua ameaça”, destaca Cléber Eduardo.
O começo dos anos 2000 trouxe títulos que atenuaram os espaços conflituosos. Apesar de filmes de combate como Madame Satã (2003) e O Invasor (2002), alguns títulos trouxeram novas formas de olhar os embates.
Diz Cléber Eduardo: “A partir de Cinema, Aspirinas e Urubus, de Marcelo Gomes, e de O Céu de Suely, de Karin Aïnouz, inicia-se uma nova fase de conflitos, mais amenos, nos quais as latências não explodem e não geram machucados, embora possam deixar feridas e travas”.
Filmes recentes como O Som ao Redor (Kleber Mendonça Filho, 2012) e Branco Sai Preto Fica (Adirley Queirós, 2014) voltam a tocar na questão dos espaços em conflito de outras maneiras, se somando ao jeito único como o cinema brasileiro olha seus espaços e confrontos. A Mostra de Cinema de Tiradentes pretende trazer a discussão para as mesas de debates, catálogo, e, claro, aos filmes a serem exibidos.
Tiradentes
A cidade de Tiradentes, localizada a 180km de BH e com apenas 7 mil habitantes, recebe durante a Mostra Tiradentes toda infra-estrutura necessária para sediar uma programação cultural abrangente e gratuita, que reúne todas as manifestações da arte.
São instalados três espaços de exibição: o Cine BNDES na Praça, no Largo das Fôrras (espaço para mais de 1.000 espectadores); o Complexo de Tendas, que sedia a instalação do Cine-Tenda (com 600 lugares), e o Cine-Teatro (com platéia de 120 lugares), que funciona no Sesi Tiradentes - Centro Cultural Yves Alves – sede do evento.
Toda programação é oferecida gratuitamente ao público.
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